| O marketing a favor das cidades Como os gestores de um município devem usar esse cada vez mais importante recurso de estratégia para movimentar a economia dos locais em que atuam No último mês a TV repetiu uma trágica cena – a de muitas cidades brasileiras sendo castigadas pelas chuvas, uma abrupta enxurrada que destruiu casas e estradas, deixou bairros inteiros ilhados e, como consequência principal, atormentou a vida de milhares e milhares de pessoas, tirando a vida de diversos cidadãos. Duas cidades foram atingidas com maior fúria: São Luis do Paraitinga, no interior de São Paulo, e Angra dos Reis, no Rio de Janeiro. E, tempos atrás, as protagonistas desse cenário de horror foram Florianópolis e parte do interior de Santa Catarina. Pelo menos hoje em dia não há perspectiva real de uma solução imediata para o gravíssimo problema. Eis então um desafio para todos os gestores municipais – prefeitos, vereadores, secretários. Como enfrentar as carências de infra-estrutura potencializadas pela ação impiedosa da natureza? E, ainda, como fazer as cidades continuarem a ter vida própria depois da catástrofe? A economia de uma cidade atingida pelas fortes chuvas obviamente sofre um baque. O carnaval de Paraitinga, principal evento turístico da cidade, por exemplo, foi cancelado. Com apenas 11 mil habitantes, a cidade, no total, recebeu cerca de 180 mil visitantes no ano passado, que geraram uma receita de R$ 20 milhões – boa parcela vinda justamente dos dias de Folia. Em Angra, os hotéis e pousadas também registram o impacto da tragédia: a cidade previa receber cerca de 500 mil turistas até o Carnaval, mas estima-se uma queda de 40% no número de visitantes neste começo de ano. Angra fatura em média R$ 90 milhões por mês com o turismo. No verão, o setor emprega 6.900 pessoas na região e gera faturamento de R$ 12 milhões por dia — cada turista gasta em média R$ 250.
Todo gestor de uma cidade conhece a força do turismo, e contabiliza os diversos benefícios que produz – a geração de capital possibilita o crescente progresso de um município e a melhor distribuição de renda entre os cidadãos. Por isso mesmo a atividade deve ser desenvolvida de maneira planejada e estratégica. A palavra marketing – que é a chave desse processo – em geral é traduzida por ações de uma empresa para analisar o mercado, desenvolver um produto, criar uma marca, e por aí vai. Mas o marketing se aplica não só a produtos. Serviços, eventos, organizações e, o que deve ser sublinhado agora, cidades podem, e devem, recorrer a esse cada vez mais moderno recurso para melhorar seu dia a dia. O marketing enfim vem ganhando mais importância para o crescimento de cidades.
Um gestor pode estar pensando agora que a cidade em que atua não tem encantos naturais para transformá-la em centro turístico. É claro que as praias, as montanhas, as cachoeiras e a arquitetura, urbana ou colonial, são atrativos espontâneos. Mas o que adianta uma bela paisagem caso não haja uma estrutura de conforto e segurança para recepcionar os visitantes que estão na cidade? Diversas cidades com potencial turístico — seja ele relacionado ao lazer ou aos negócios e serviços — sofrem com a falta de visão dos governantes, que condenam essa atividade a um plano secundário. Esse é o ponto: o bom marketing de uma cidade engloba a busca pela permanente melhoria de hotéis, restaurantes e opções de lazer, o que também melhora a vida de seus moradores. Planejamento acertado e investimentos bem feitos fazem a diferença. Dubai, a badalada cidade dos Emirados Árabes, é o principal exemplo. Há cerca de 20 anos Dubai não passava de uma cidade perdida no meio do deserto. Um bem orquestrado plano de marketing e, no caso, um bilionário investimento elevaram a cidade a um grande núcleo de negócios – negócios que sempre acompanham mesmo o grande êxodo de turistas rumo a um ponto do planeta. Um caso brasileiro foi objeto de estudo desenvolvido pela PUC do Paraná. A universidade fez uma análise sobre o projeto turístico desenvolvido na histórica cidade de Tiradentes, Minas Gerais. Apesar da sua vocação turística, Tiradentes até a década de 1990 não tinha o turismo como uma de suas mais consideráveis fontes de renda. No primeiro semestre de 1998, a recém- criada Secretaria de Turismo da cidade realizou um levantamento identificando que, por meio do turismo, a cidade não só poderia melhorar a qualidade de vida dos cidadãos como promover a preservação do patrimônio histórico-natural. O primeiro passo foi organizar e consolidar os eventos tradicionais: a Semana Santa, a comemoração da Inconfidência Mineira e o Carnaval foram reestruturados e passaram a ser destaque na agenda do município. O segundo foi desenvolver novos eventos e festas que pudessem atrair turistas em outros períodos do ano. Hoje a cidade conta com um intenso calendário, que inclui a Mostra de Cinema em janeiro, o Carnaval, a Semana Santa e Semana da Inconfidência, ambas em Abril, o Encontro de Harley Davidson, em junho, a Fest Gourmet, em agosto, o Festival Internacional de Fotografia, em outubro – e, claro, o Natal e o Réveillon, recentemente incrementados. Ou seja, Tiradentes agora tem programação para o ano todo. Uma boa solução de marketing.
A estratégia definida pelos gestores de Tiradentes é a de desenvolver eventos que atraiam um público diferenciado, com alto poder aquisitivo e que busca eventos culturais e de estilo de vida, reforçando, com isso, a identidade histórica da cidade. O marketing não parou na definição do calendário. A ação seguinte foi promover a cidade em revistas especializadas, televisão, folders, encontros do trade turístico, internet e todos os outros meios de comunicação, e com isso contou também com envio de malas-direta por e-mails e telemarketing. O município precisou investir em infra-estrutura e em programas de treinamento para a população. E o empresariado local apostou no projeto: o número de hotéis e pousadas triplicou na última década. A chegada de novos negócios obrigou os empreendedores da área a melhorar a qualidade dos hotéis. Segundo dados da Secretaria de Turismo de 2005, havia na cidade mais de cem empreendimentos hoteleiros, somando 4.700 leitos e 38 restaurantes. Um atrativo e tanto para que viaja até lá – e deixa boa parte do dinheiro que acaba movimentando a cidade, uma equação que os gestores precisam ter mesmo sempre entre seus documentos administrativos.
O turismo expande as mais variadas ramificações da economia. Hoje 95% dos recursos financeiros de Tiradentes estão vinculados ao setor de serviços como um todo. Segundo a Fundação João Pinheiro, a renda per capita média do município cresceu 97% e a pobreza diminui 55% nos últimos dez anos. E mais – o turismo teve influência fundamental na conservação do centro histórico da cidade. Nas devidas proporções, o mesmo pode ser feito por todo gestor de cidade no Brasil. Afinal grande parte das localidades possui uma história rica, uma cultura local, belezas naturais e até um comércio e serviços que podem ser explorados. Os governantes interessados em ativar o turismo em seu município devem sair do discurso para a prática promovendo ações que possibilitem este encaminhamento. Dados da OMT-Organização Mundial do Turismo mostram que o turismo gera cerca de US$ 4 trilhões por ano em todo o mundo, além de gerar mais de 280 milhões de empregos diretos e indiretos. Um gestor consciente vai deixar a cidade em que vive a população que lhe dá suporte de fora? Bibliografia: Tadini Júnior, Ângelo Benjamim Costa; Silva, Fábio Duarte De Araújo; Oba, Leonardo. Cidade Comprada Vs. Cidade Vendida: o Marketing Territorial Em Tiradentes, MG. III Encontro Da Anppas, Brasília, 2006. | |
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